Andrei Thomaz Oss-Emer[1]

Flávio Dal Pozzo[2]

Desde 2019, o papa Francisco tem insistido em algumas frentes importantes para a compreensão sociopolítica e transformadora da realidade. Nesse sentido, são destaques a Economia de Francisco e o Pacto Educativo Global[1], que têm motivado e multiplicado debates e práticas integradoras entre política e sociedade em todos os territórios de nosso país. Neste ano em que iremos escolher os novos representantes do legislativo e do executivo municipal em todo o Brasil, faz-se necessário e urgente reencantar a política em nossos lugares, tomando essas propostas do Papa como base para as nossas escolhas.

Na maioria de seus pronunciamentos e publicações, o pontífice tem insistido que o amor político pode criar pontes, assim como as “pontes de Santa Clara”, rememoradas de muitas formas pelas juventudes brasileiras na Economia de Francisco e Clara, que é luz de esperança, compromisso, encarnação e profecia nas realidades sociais, políticas e econômicas de nosso país. Essa perspectiva reforça o “convite ao diálogo sobre a forma como estamos construindo o futuro do planeta e sobre a necessidade de investir nos talentos de todos, porque todas as mudanças precisam de um caminho educativo para fazer amadurecer uma nova solidariedade universal e uma sociedade mais acolhedora”[2].

Esse não é apenas um convite, mas um desafio destinado à humanidade para que possamos juntos assumir o compromisso educativo a fim de que, na reciprocidade dos dons e das funções, atuemos nossos talentos na efetivação dos 7 compromissos propostos pelo Pacto Educativo Global[3], a saber:

  1. Colocar a pessoa no centro: fazer com que a pessoa esteja no centro de cada processo educativo, realçar a sua especificidade e a sua capacidade de se relacionar com os outros.
  2. Ouvir as gerações mais novas: escutar a voz das crianças, dos adolescentes e jovens para juntos construirmos um futuro de justiça e de paz, uma vida digna para cada pessoa.
  3. Promover a mulher: favorecer a participação plena das meninas e das jovens na educação.
  4. Responsabilizar a família: ver na família o primeiro e indispensável sujeito educador.
  5. Abrir-se à acolhida: educar e educar-nos à acolhida, abrindo-nos aos mais vulneráveis e marginalizados.
  6. Renovar a economia e a política: estudar novas formas de compreender a economia, a política, o crescimento e o progresso, a serviço do homem e de toda a família humana na perspectiva de uma ecologia integral.
  7. Cuidar da casa comum: proteger os recursos do meio ambiente, adotando estilos de vida mais sóbrios e visando utilizar energias renováveis e sustentáveis.

Neste ano, somos convidados a escolher democraticamente nossos representantes para o executivo e o legislativo municipais. Trata-se de um direito inalienável, conquistado pelo povo brasileiro, construído e sustentado com a permanente participação das pessoas de forma organizada, que se inicia no processo de decisão, escuta e escolha das/dos vereadores e prefeitos (as) e que continua no acompanhamento dos eleitos após as eleições.

De quem se candidata, espera-se que tenha vocação política, ou seja, capacidade e talento para viver a política como o “amor dos amores” e capacidade e talento para não mais pensar e agir somente para seus interesses ou os do seu grupo, mas para realizar efetivamente os compromissos do pacto. Trata-se de pensar e agir por amor aos excluídos da economia e da política, aos invisíveis, aos marginalizados, pensar e agir para colocar sua capacidade e seu talento a serviço da política e das suas instituições, com força e coragem para que as instituições, ao atuarem a política como “amor dos amores”, se façam efetivamente presentes na vida de todas as pessoas, especialmente naqueles espaços mais degradados e ausentes dessa política.

E para todas e todos nós que iremos escolher os nossos representantes, se exigem igualmente capacidade e talento para compreendermos e vivermos a política como o “amor dos amores” – tarefa que não pode ser exercida de forma isolada. Ela exige o nosso esforço, a nossa paciência e coragem para criamos uma rede de relações abertas capazes de derrubar muitas das nossas trincheiras ideológicas, colocando em questão nossas certezas. Exige ainda o esforço de criarmos pontes capazes de nos colocarem em relação, em diálogo diante das pessoas que possuem uma compreensão de mundo distinta da nossa e do nosso grupo.

O convite ao amor político é um convite que abre as portas do coração de cada um de nós, cidadãos conscientes e responsáveis, e nos convoca a escolhermos, apoiarmos, dialogarmos e questionarmos aquelas pessoas que se colocam a serviço do bem comum e dispõem de seus nomes para a composição política dos municípios.

Dar nova alma à política é uma tarefa da nossa vocação humana que nos interpela a vivermos em sociedade, para cuidarmos reciprocamente das pessoas e da nossa casa comum. Implica sermos conscientes de que a política é expressão real da vida humana em comunidade e está a serviço do bem comum de toda a humanidade, porque sua vocação é a vida em comum.

Por meio de iniciativas como a Economia de Francisco e Clara e o Pacto Educativo Global, o papa Francisco nos convida a reconhecermos que os gestos falam mais que as palavras, que as práticas devem estar em consonância com as ideias e que o todo representa mais do que a soma de suas partes, ou seja, que o valor da comunidade é um dom, e que é desde a comunidade que somos chamados a dar respostas à sociedade. Somente assim conseguiremos desenvolver nossos talentos, aprender a amar de forma política e, especialmente, escolhermos aquelas pessoas com capacidade e talento para viverem a política como amor – amor coletivo e institucional capaz de responder aos desafios desse nosso tempo, em comunhão.

 

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[1] Disponível em:  http://www.educationglobalcompact.org

[2] Vedemecum do Pacto Educativo Global, p. 3.

[3] Vedemecum do Pacto Educativo Global, p. 9.

[1] É doutorando em Filosofia Moral e Política pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel), agente da Comissão Pastoral da Terra, membro de The Economy of Francesco.

[2] É analista de informação e comunicação na empresa pública Procempa, da prefeitura municipal de Porto Alegre, mestre em Políticas Públicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e membro do Centro Nacional do MppU/Brasil