Diante de um oceano de ofertas, quais são as suas fontes de informação política?

Flávio Dal Pozzo* e Luís Henrique Marques**

*presidente do Movimento Político pela Unidade (MPpU)

** editor-chefe da revista Cidade Nova.

Esse artigo contou com contribuições do jornalista José Antônio Faro.

Font: Cidade Nova | Outubro 2022 – Um país sob o olhar da fraternidade

revista@cidadenova.org.br

 

MÍDIA Uma das questões cruciais no exercício da cidadania é o acompanhamento crítico do noticiário sobre política. Neste artigo, os autores propõem um pequeno percurso reflexivo no sentido de aprimorarmos essa prática.

 

PARA AUXILIAR-NOS a seguir em frente na reflexão proposta pela pergunta que serve de título para este artigo, apresentamos essa mesma questão de outra maneira: diante do oceano de fontes de informação sobre política, cujo fácil acesso é oferecido pelas novas tecnologias e pela internet, podemos nos considerar pessoas conscientes e bem informadas sobre o universo político?

 

Possivelmente, a grande maioria das pessoas tem certeza de que se informa bem e o faz da melhor maneira possível. Contudo, quando o assunto é política, especialmente em ambientes digitais com algoritmos ainda pouco compreendidos e que condicionam fortemente o conteúdo que acessamos ou deixamos de acessar, temos dificuldade de perceber se estamos efetivamente nos informando bem. Na maioria das vezes, nem sequer nos colocamos essa questão.

 

Em se tratando de política, dificilmente iremos encontrar um canal de informação isento de interesses e posicionamentos. Isso decorre do fato, entre outros motivos, de que a imprensa, em um ambiente capitalista, vive de “vender notícias”, isto é, ela é um negócio. Trata-se de considerar uma relação comercial que marca tanto os veículos tradicionais da imprensa quanto os canais de informação que acompanhamos nas redes sociais. Isso tem implicação direta em como matérias informativas e textos de opinião são produzidos por jornalistas e especialistas e, igualmente, nas frequentes mudanças de posicionamentos em função desse tipo de interesse.

 

Outro fator importante a considerar é que a maioria desses canais pode ter, além do interesse econômico, um engajamento político e de valores. Nesses casos, é interessante considerar que as empresas, grupos ou pessoas, a fim de atingir certos objetivos políticos, utilizam-se estrategicamente desses canais para “plantar” ou disseminar determinadas informações. Vale salientar ainda que boa parte delas, consideradas fatos políticos, são, na realidade, meras especulações, quando não meias verdades ou até mesmo inverdades.

 

Se é assim, podemos nos perguntar: conseguimos perceber a importância de fazer um exercício para avaliar a linha editorial, ideias e valores de cada um desses canais de informação? E, consequência disso: conseguimos avaliar se existe uma diversidade de posicionamentos, ideias e valores entre eles?

 

Muito possivelmente, sem esse necessário exercício, mesmo acreditando que nos informamos de modo adequado sobre política em ambientes digitais, dificilmente conseguiremos perceber a qual viés ou a quais vieses de ideias e valores a informação que consumimos e compartilhamos se alinha ou se, ao menos, ela busca apresentar uma posição equilibrada sobre o assunto que aborda.

 

Diante da questão inicialmente proposta nesse artigo, como podemos avançar com essa avaliação? Um primeiro movimento fundamental para iniciarmos esse exercício de avaliação dos canais de informação passa, necessariamente, por encontrarmos e darmo-nos um tempo adequado para observarmos (se existir) qual a tendência de visão de mundo que assumimos. Igualmente importante, é preciso identificar e olhar para o horizonte de mundo que queremos construir e o que é necessário acontecer para alcançá-lo. Isso implica considerar se nossas opções têm ou não convergência com valores, como o bem comum, a solidariedade, o respeito ao outro, a cultura de paz, a justiça social, a dignidade humana. Isso nos ajuda a não permanecermos em uma posição passiva ante as notícias.

 

Além disso, considerando que somos seres sociais e relacionais, é lógico que esse exercício não deveria ser feito apenas de forma individual (ainda que isso já seja um grande passo), mas realizado com outras pessoas, especialmente com aquelas que tenham posições políticas diversas.

 

Para ajudar-nos nesse empreendimento, uma dica que julgamos pertinente é convidar o leitor a dar atenção ao jornalismo analítico e interpretativo que, a propósito, tem crescido muito na internet. Muitos jornalistas, com o seu olhar clínico e respeitada bagagem profissional na cobertura dos fatos políticos, realizam um trabalho de excelência nesse sentido, indo além do anúncio daquilo que é meramente factual. Eles oferecem uma leitura aprofundada desses fatos, conectando-os com lógica, apresentando suas incongruências, discutindo posicionamentos e assim por diante.

 

Feito esse movimento inicial e buscando manter um afastamento temporário das ideias e do governo aos quais estamos alinhados ou apoiamos, possivelmente conseguiremos criar as condições necessárias (um ambiente mais racional e, portanto, menos emocional) para exercitar a avaliação sobre os canais de informação política que utilizamos.

 

Para que esse exercício possa ser efetivo, além desse ambiente favorável, é necessário considerar algumas questões que precisam permear essa avaliação. Inicialmente, é preciso identificar, o quanto possível, as pessoas que movimentam na linha de frente esses canais e quem são os seus patrocinadores. Ademais, importante observar se a linha editorial se aproxima mais da linha conservadora, progressista, radical, socialista, liberal etc. Caso não tenha clareza sobre o significado político dessas palavras, reserve um tempo para pesquisar e conhecê-las. Por fim, é fundamental verificar a proximidade de cada canal com esse ou aquele governo, com esse ou aquele partido, se apoia ou se faz oposição ao governo.

 

Ao fim desse exercício, se conseguimos mapear essas informações sobre os canais de comunicação (empresas, grupos ou pessoas) nos quais buscamos informações políticas, temos a possibilidade de identificar e avaliar se o conhecimento político de que dispomos está ancorado em informações de qualidade ou não. E ainda: poderemos perceber que, assim como o outro, também nós estamos alinhados a determinada linha editorial ou corrente de ideias e valores. Se a maioria dos canais que seguimos ou se todos eles são somente conservadores ou progressistas, liberais ou socialistas, somente a favor ou contra determinado governo, não é difícil concluir que a informação que aceitamos e compartilhamos, por mais que seja de qualidade, possui um viés de ideias e valores fortemente definido. Assim sendo, devemos reconhecer que essas informações ou as críticas podem ser limitadas a uma perspectiva.

 

No espaço político, para se alcançar uma informação ponderada e de qualidade, é fundamental, tendo presente o horizonte de mundo que se quer analisar, que essa informação seja efetivamente mesclada por uma diversidade de ideias e de canais.

 

Por fim, não é de hoje que pesquisas em comunicação demonstram que pessoas com engajamento político – (não necessariamente em partidos, mas em associações de moradores e profissionais, pastorais sociais e outros grupos com atenção a políticas públicas, entre outras organizações) – costumam fazer uma leitura mais refinada dos fatos políticos – logicamente porque contam com a referência da prática, da experiência e da proximidade com as ações políticas presentes ou não nas vidas delas e na das suas comunidades, e não são meros consumidores de mídia. Isso, aliás, independe da formação acadêmica do cidadão. A atuação política (no sentido amplo) dá a ele perspectivas mais amplas e lúcidas sobre esse tipo de tema em relação a quem se limita a consumir informações pela mídia convencional ou pelas redes sociais.

 

Ao fim dessa reflexão, convidamos os leitores de Cidade Nova a reexaminarem suas fontes de informação e fazerem esse percurso reflexivo sobre a relação que possuem com elas. Depois, se quiserem e puderem, compartilhem conosco a que conclusões chegaram. Quem sabe possamos ter novas perspectivas que nos ajudem a aprofundar a reflexão aqui iniciada.